30 de novembro de 2011

Pulsação

Quando ensaias com cuidado a expansão
Chega ligeira e alerta a contração
E nesse bater descompassado do teu coração
Causas em mim sempre forte pulsação
Com olhos cerrados vejo a aparição
Em deleite me entrego sem impor condição
Permitindo a meu vulção a errupção
Que te fará sentir toda minha vibração



Palavras inéditas

 Vasculho os cantos em busca de palavras inéditas
As que conheço já não dão conta de expressar meu íntimo
Procuro-as minuciosamente por onde passo
Esquadrinho os mapas de minhas vastas memórias
Para ver se encontro alguma que despercebida ficou
Aquelas que me pegaram desprevinida e ao largo passaram
Entrego-me inteira a qualquer vestígio, qualquer pista
Investigo a olho nú e com minúcia para encontrá-las
Não precisam se encaixar perfeitamente
Quero aquelas que podem render-se à métrica das minhas emoções
Quero apenas as capazes de revelar-me renovada a ti


29 de novembro de 2011

Mergulho

Ah! Se eu evaporasse e me misturasse às nuvens
E num forte temporal inundasse teus domínios?
Ah! Se eu em brasa ficasse e em chama me transformasse
E num incêndio encantado tua floresta queimasse?
Ah! Se eu em grãos me convertesse e me jogasse ao chão
E no teu solo fértil, regada de amor, germinasse?
Ah! Se eu me picasse e em pequenas partes me guardasse
E numa brisa leve em teu jardim florido pousasse?
Ah! Se eu em concha me fechasse e um grão de areia me ferisse
E em tuas mãos acolhedoras em pérola me revelasse?
Ah! Se eu em ar me transfigurasse e de vento me disfarçasse
E num forte vendaval para longe do mal te levasse?
Ah! Se eu em água me transmutasse e aos rios me juntasse
E numa brava corredeira a tua alma lavasse 
Ah! Se eu um pássaro virasse e para muito alto voasse
E num mergulho insano simplesmente a ti me entregasse?

Pecado

Pecado é deixar apodrecer a fruta
Pecado é não colher o amor que se oferece
Pecado é contrair quando a vida pede expansão
Pecado é reter o que sente para viver o que se pensa
Pecado é deixar de ser o que se é
Deixar de viver o que se quer
Enrijecer o que é fluido
Desperdiçar o tempo justo
Esperar que o amor se vá com o vento
E acreditar que isso é possível


A girar

Flutuo sobre um tapete de algodão
Do horizonte azul vêm as notas de uma canção
As cordas e sopros penetram-me as vísceras
À frente um vasto lago de ar se oferece ao mergulho
Mas, prefiro fechar os olhos e dançar em rodopios
Carregando-te em meus braços fluídos
Girando-te para que vejas outros mundos
Olhando-te para saber-te em mim


27 de novembro de 2011

Pegadas

Na densa floresta onde abri minhas picadas
Volto vez ou outra para revisitar cada passo dado
Certificar-me de que não são fantasias por mim criadas
Abastecer-me de memórias cheias de significado
Reconhecer os atalhos que se reveleram ciladas
Descansar na clareira com o espírito desanuviado
Preparar corpo e alma para deixar novas pegadas

22 de novembro de 2011

Neblina

Minha alma ventila quando contigo troco
Como brisa mansa ou como forte vendaval
Sorrateira e sabiamente desarrumas as certezas
No aparente desconexo a clareza se apresenta
Sinto-me só e acompanhada na inquietude do silêncio
E dos ruídos que me enchem crio a música do vento
Que percorre a neblina para abrir caminho dentro
Com olhos turvos e atentos dou nitidez a meus sentidos
E revelo escancarando uma porção do meu intento

Cabeceira

Leio-te e releio-te incontáveis vezes
Incansável ponho-me a folhear-te
Aliso as páginas para sentir-te em palavras
Captar a mensagem sutil de tuas entrelinhas 
Ver com os olhos da minha alma o que arde na tua
Leio-te sempre com avidez e deleite
Mas, também com temor e suspense
És para mim como o livro que se destaca na estante
E de lá sai para viver para sempre à cabeceira
Para que eu possa todas as noites descobrir detalhes
Mergulhar em tuas histórias, desvendar algum mistério
A cada leitura minha conhecer novas facetas
Imaginar novas possibilidades
E, quem sabe, com meu olhar ajudar-te a compreender-te



Sim

A ti sempre digo sim
Mesmo quando não apareço
E estendo-te a mão em aceite no teu jardim
Meu sim a ti arremeço

A ti sempre digo sim
Mesmo quando surge o insentato não
E explodo mesmo sem estopim
Meu sim a ti é expressão

A ti sempre digo sim
Mesmo quando arrasa-me teu intenso temporal
E sem vestes chego a pensar no fim
Meu sim a ti é integral

A ti sempre digo sim
Mesmo quando desvia-me os olhos ávidos
E deixa-me na boca gosto ruim
Meus sim a ti são sempre grávidos

A ti sempre direi sim
Mesmo se insistires em o amor negar
E pensares que poderei de ti desistir enfim 
Meu sim será a marca de meu olhar

20 de novembro de 2011

Aprendendo a voar

Levas-me para bem longe daqui
Voas comigo para acima das nuvens
Deixas-me ver o teu céu bem pertinho
Mostras-me um tanto das tuas fraquezas
Mesmo em segredo admitas tuas forças
E na contradição de tuas veias
Misture teu sangue a uma gota do meu
E do alto me largues pois voar já saberei




Indelével

Com a veemência da tua existência
Deixas indelével marca em meu destino
Com a doce acidez da tua influência
Cravas em minha carne o teu dom ferino
Com a brisa suave da tua eloqüência
Falas bem alto direto ao meu tino
Com tuas resolutas e breves palavras
Cunhas uma efígie em minhas memórias
Com a infinita ilusão de tua calma
Transborda-te em mim feito mar em ressaca

Armadura de renda

Talvez eu simplesmente nada entenda
Intercalo a escuridão e o que a mente clareia
Hesito em tirar dos meus olhos a venda
Vou tateando tuas bordas para alcançar a candeia
Tento acender a chama para iluminar a fenda
E ver com mais clareza onde erguerei meu castelo de areia
Que bravamente guardarei vestindo armadura de renda

19 de novembro de 2011

Matheus


Com moedas banhadas em meu sal
Pago-te todos os impostos
Junto tudo para ter o integral
Quitar débitos pressupostos
E depois, pedra a pedra, erguer nossa catedral
Lugar bendito que não abrigará antigos desgostos
Para com o que parecem cacos montar um lindo vitral
E, assim, contar a história de todos os nossos encontros

14 de novembro de 2011

Metáforas

Responda-me às metáforas
Mas, somente aquilo que sentires próprio
Construa com imagens os teus dizeres
Para que eu exercite o desvendar de tuas minúcias

Responda-me às enxurradas
Deixes escorrer mesmo que sejam palavras duras
Inunde-me com o prazer de decifrar-te
Afogue-me com tuas reflexões puras

Responda-me às revoadas
Libertes tuas letras num sereno planar
Sobrevoe-me o tempo que quiser
Aterrisses em mim numa hora qualquer

Responda-me às venturas
Registres os saberes de tua sorte
Para lidar com o perigo quando aparecer
E se quiseres posso ser a bussula que aponta teu norte

Pintura: Maryam Hashemi

13 de novembro de 2011

Degas

Sentir-te rondando meu entorno
Faz tremer as minhas pernas
Deixa meu coração aos pulos
Traz-me engasgo às palavras

Perceber as sutilezas que bailam
Enternecem minha alma
Faz a ti apresentar-me nua 
E nunca deixar de ser clara como a cheia lua

Prometeu

Há em mim algo de Prometeu
Gosto de brincar com fogo
E não porque há em mim insensatez
Apenas não quero por medo de queimar-me
Sustentar-me na estabilidade da prudência
 E assim acorrentar-me às convenções
Quero mesmo é transformar-me a cada instante
Deixar arder meu peito em grande chama
Aquecendo-me feliz no intenso calor da vida




11 de novembro de 2011

Espiar

Espia-me pelo buraco da fechadura
Mas, lembra-te que a porta está entreaberta
E não farei do flagrante uma desventura
E mesmo que do que vejas estejas incerta
Digo-te que sou apenas fruto da tua semeadura
E que estou atenta e pronta para qualquer descoberta
Pois do que por ti sinto desde sempre sou segura

9 de novembro de 2011

Alvo

Quero transformar tua vida em poesia
Mas, épicos se fazem com pitadas da drama
De histórias repletas de glorias e agonia
E de amores vividos em complexa trama
Que deixam o coração com certa avaria
Mas, do amor,  nunca capazes de apagar a chama
Pois, para o cupido é eximia a pontaria
E para ele faço-me alvo feliz em tua cama 

2 de novembro de 2011

Colheitas

Deixe-me colher-te em minhas mãos
Que com cuidado replantarei a muda da redenção
Prepararei a terra com afeto e dedicação
Adubarei, é claro, com um tanto da minha razão 
Regarei com lágrimas da mais pura emoção
Acompanharei o vir à luz do broto da expansão
Cuidarei das flores que virão em profusão
Colherei apenas uma como sinal de gratidão
E te darei para que saiba do que sinto a dimensão
Para que o amor nunca deixe de ser a tua inspiração



Brinde

Eu brindo a vida e a tudo o que ela me dá
Eu brindo aos amores todos
De todos os tipos, daqui e de acolá
Até mesmo aqueles que com o tempo ficam rotos
E há os infantis que a nada podem levar
E os de fogo intenso que para apatia são antidotos
E que arrancam nacos da alma e nos fazem mudar
Eu brindo a todos os amores
Aqueles passageiros e aos que se entranham devagar
Eu brindo aos amores que vieram e aqueles que virão
E brindo a esse do meu eterno agora
E a ele dedico minha total devoção


Cordel

Na doida mistura do teu doce com fel
Sacio minha sede de amor sem fronteira
Compreendo confusa a tua Babel
E empunho segura a tua bandeira
Carregando no peito o infinito anel
Confiando outra vez que a dor é derradeira
Para contigo cantar nosso bonito cordel

Corda Bamba

No compasso das horas
No correr ligeiro do tempo
No esperar do futuro incerto
Vivo este presente que parece lento
E para fina esperança desperto
Deixo os passos firmes na corda bamba
Para, quem sabe, flutuar em terra firme

1 de novembro de 2011

Densidade

Em teus densos ares sou um ser flutuante
Permito-me voar sem caminho traçado
Até encontrar teu silêncio insinuante
E concluir sorridente que não há destino acabado
Assim volto a cruzar com teu olhar penetrante
Capaz de deixar meu tolo coração constelado
E no pulsar descobrir o que é de fato importante

Acrobacias

Dispenso a rede em minhas acrobacias
Viro de ponta cabeça para organizar as idéias
E nesse embaralhar perco-me em nostalgias
Do tempo disperso para entender tuas filosofias
Transito na curva em que se cruzam nossas biografias
Trajetória de velhas e inquietas almas em suas travessias
Viajando do núcleo profundo para compreender as periferias