28 de fevereiro de 2012

Sorver

Que desejo imenso de te olhar
Degustar em êxtase o sabor da tua imagem 
Beber com minha retina pequenos goles do teu ser
Sorver devagarinho o relance da tua passagem
Da-me o prazer da tua presença
Mate-me a sede embebida na saudade
E me embriagues com o resvalar da tua pele 
Vem, atende urgente essa minha querença


Aplauso

Ah! Esses dramas particulares
Intransferíveis que se postam-se à porta
Ficam à espreita aguardando um descuido
Um vacilo qualquer, um piscar do olhar vago

Ah! Essa comédia da vida privada
Ri em escancaro da minha vigília
Sem vergonha se expõe toda prosa
E me faz rir dos meus tantos ridículos

Ah! Essas tragédias cotidianas 
Coisinhas pequenas que amplifico na alma
E no segundo seguinte se mostram risíveis
E fazem minha face corar de vergonha

Ah! quero mais é tomar minhas pílulas de felicidade
Do teatro da vida criar um feliz final 
E a cada dia começar outro ato 
Se vieres comigo, grito bravo e aplaudo


Sinfonia

Sabes bem que o que me dizes
Pode ganhar as vestes da poesia
Pode vibrar na alma como fantasia 
E fazer a noite virar dia
Posso até compor uma sinfonia
Do alegro criar a harmonia
Revelar no andante minha ousadia
No minueto confirmar a velha profecia
De que sem ti fico fora de sintonia
E a saudade vem com a ventania
Então, vem logo me fazer companhia
Derrete o tempo que me tira a alegria
E vive comigo a mais linda eufonia


27 de fevereiro de 2012

Castelo

Quero brincar na caixa areia dos meus sonhos
Dos ínfimos grãos construir minha imagem de futuro
Dar forma a esse ser que reconheço feliz
Deixar vir ao mundo mesmo que ainda prematuro
Construir castelos, paisagens e caminhos
Dar luz a tudo o que ainda repousa no escuro 
Viver a vida breve nesse tempo eterno
Ir adiante mesmo que não pareça seguro



Enfeite

Em minha mão direita carrego-te
Como lembrete e lembrança adorna-me
Enfeitas-me de fantasias e desejos
Desnudas-me de todos os medos
Cobres-me toda de beijos
Envolvas-me com tudo que é teu
Possuas o que te pertence
Que dou-te minha mão esquerda


26 de fevereiro de 2012

Livre

Contigo conheci a liberdade
Sou de ti e solta sou
E no deserto habitado de emoções
Esse lugar que bem conheces
Transbordo intensamente meu amor
Contigo sou poeta e poesia
Conto, fábula, prosa e fantasia
Sou fogo, terra, água, substância e vapor


24 de fevereiro de 2012

Instinto

O vento molhado umedece minha face
Na chuva fininha encontro pretexto
Desculpa perfeita para o sal que escorre
Mas, não é tristeza nem desalento
É só a saudade que me come por dentro
Bicho lindo e estranho esse amor que eu sinto
Que entende o que é longe pois te sente tão perto
E inquieto se perde em teu labirinto
Pois bem sabe que há um caminho aberto
Então segue feliz o seu faro, instinto

Poeta

Quero escrever-te a poesia perfeita
Traduzir em poucas linhas o amor singular
Falar da pluralidade insuspeita
Da confusão que te é particular
Das dúvidas e certezas que ficam à espreita
E não nos deixam o risco calcular
Tranco, então, a precaução na gaveta
Para livre do medo entregar-me a teu olhar
Voar solta feito borboleta
E só pela emoção me guiar
Ah! Tem dias que só sei ser poeta


Pintura: Esvoaçar de um beijo, de Ines Massano

Insone

O corpo pede cama 
 A alma clama chama
Do cansaço tiro a força
Que depois das escuras horas 
Hei de entregar ao dia
Que se achega devagar
Fazendo charme para chegar
Vou esperar bem sorrateira
E para driblar a inquietude
Deitarei a pálpebra seca
No teu coração em brasa


À mão

Eis minha mão
Está a tua frente, agarre-a
Haverei de segurar-te, abraçar-te
Haverei de proteger-te dos ventos internos
Esses que intentam espalhar teus fragmentos
partes de ti que te impelem à loucuras
Mas, em troca peço-te a tua
para colher a lágrima torta
que me molha a saudade


22 de fevereiro de 2012

Craquelê

Entardeci com certo craquelê
Às vezes é assim mesmo
A alma inquieta que é
se espanta com a alegria
vem de chofre e desconfiada
querer saber os porquês do sorriso
Dou logo um chega prá lá para ver se ela entende
Aplico um daqueles severos corretivos
Ora, veja lá se isso é coisa a se questionar
Deixa eu ser feliz, mesmo que de brincadeira
Vá craquelar em outro lugar


20 de fevereiro de 2012

Composição

Para mim, quero que componhas uma música
Que misture na letra palavras, gestos, olhares
Que tenha dose de erudito e uma porção de brega
Que a melodia me leve contigo a todos os lugares

Para mim, quero que escrevas um belo conto
Que fale do teu amor intenso, vulcânico e plural
Que dê aos personagens a verdade que lhes cabe
Que o enredo me enrede como paixão carnal

Para mim, quero que pintes um imenso quadro
Que combines as cores do incombinável
Que dispenses as retas, medidas e esquadro
Que traduza em formas o imponderável

Para mim, quero que cantes uma canção
Pode ser qualquer uma, até uma por outros já cantada 
Mas, que saindo de tua boca seja pura emoção
E me arrebates para sempre, pois só hoje é quase nada


Arte

Sou expressão séria
És sorriso largo 
Se por pouco tempestuo
Tu manténs a calma
Se quero já, agora
Tu sabes esperar
Se carrego no que é cinza
Colorir é tua parte
Se sou drama e tu comédia
Nosso amor é pura arte


15 de fevereiro de 2012

Tempo

Tempo, quem és tu tempo?
Disfarça-te de segundos, minutos, horas
E também de dias, meses, anos
Quero ver-te sem as vestes
Desmascarado, nú em pelo
E na nudez de tuas luzes
Sem pressa e sem demora
Descobrir como entender-te


14 de fevereiro de 2012

Tradução

Falas da minha paciência
Enalteces minha docilidade
Anuncias minha generosidade
Agradeces a minha compreensão
Reconheces meu sal, meu doce
 Mas, junto tudo numa só palavra
Pois o amor é minha tradução


Contradição

Eu gosto da possibilidade de mudar de opinião
Não quero me prender às frágeis certezas
Então, sigo sem receio da contradição
Tudo em mim se modifica constantemente
Embora guarde sempre alguma convicção
Por isso, quero mesmo é arejar as idéias
Ver o mundo com um olhar diferente
Para as tradições dizer ora sim ora não
Quero assim construir minhas sendas
Sempre a questionar o que é convenção
Pois a vida em liberdade é a maior da prendas
Ser escrava de mim mesma, isso não



13 de fevereiro de 2012

Desalinho

Vem me ser um pouquinho
Mas, um me ser devagarinho
Cheio de amor e carinho
Da-me da tua boca um bocadinho
E do teu céu uma nuvem ninho
Deixa agora meus cabelos em desalinho
Que te sorvo como a um bom vinho
E polvilho de flores o teu caminho


Pintura: Elisabetta Trevisan


4 de fevereiro de 2012

Cura

Vou até ali e já volto
Mas, quero-te perto de mim
Enquanto cruzo as águas
Desdobra-te e acompanhas-me
Aproxima-te, meu bem!
Traz tua voz em sussurro
Solte as letras num arfar inebriante
Acendas-me com tua indecência pura
E fica comigo mesmo que distante
Pois, tua presença é para mim dos males a cura

Pintura: Gustav Klint

3 de fevereiro de 2012

Raizes

Sob a sombra de nossa árvore estamos
Vem, aconchega-te
Enches de cor e brilhos a pálida paisagem 
Feches teus olhos para ver minha alma
Deites suavemente em meu colo
Enrosca-te em minha raízes
E esqueça-te de todo o resto

Pintura: Leonid Afremov

Captura

Sobrevoe-me
Aviste-me do alto
Contemple meu amor 
E num rasante, capture-me 
De ti sou presa 
Pra ti sou livre