26 de janeiro de 2014

Pingente

Encomendei a lua em fio
Um fino fio de prata
Delicado e reluzente
Nele vou pendurar-me como pingente



24 de janeiro de 2014

Todo?

 Conhecer-me?
Ah! Não precisa-se muito
Paciência, talvez!
Olhar arguto é bom!
Algum tempo, quiça!
Bom ouvido, eu gosto!
Compreensão às imperfeições, desejo!
Para conhecer-me, basta querer!
Mas, quero dar-me em pequenas partes
Cada dia um bocado, uma nova peça
Encaixe-as como e onde desejares
Complementa o todo como quiseres
Quem sabe parte de mim nele estará!


Pintura:Claire Watson

Rosas

Elas sabem-se delicadas
Exibem-se coloridas
Orgulham-se do perfume
Mas, as rosas são ariscas
Em seus caules, se retorcem
Como se até de si se esquivassem
Como se os próprios espinhos evitassem
Suas firmes folhas tem serrilhas
São como um sutil aviso de atenção
Amiúde secam como se extinguísse a vida
Mas, apenas estão reclusas, ensimesmadas 
De repente, de novo se esverdeiam
E, em seguida, exibidas, dão em flor
De novo, iniciam a sedução
E eu, outra vez, até aos espinhos pronta estou


Pintura: Claude Monet

22 de janeiro de 2014

Vagos e etéreos

Quase sempre vagos
Quase sempre etéreos
Assim são os objetos da inspiração

Tem vez que vem do ar
Um cheiro de saudade que o vento traz
Uma cor, um brilho que invade a janela
Um som que d´algum lugar chega

Tem vez que vem da água
Face vincada por lágrima escorrida
Céu acinzentado que carrega chuva fina
Tsunami de emoções extemporâneas

Tem vez que vem da terra
Chão que me guia e sustenta
Poeira que me desorienta, cega
Jardins que encantam a alma

Tem vez que vem do fogo
Brasa silente que me chamusca os pés
Lareira acesa em noite fria
Combustão espontânea de quereres muitos

E tem vez que apenas vem
Sabe-se lá de onde, apenas vem


Pintura: Emma Warren

Desequilibra-me

Desanda-me, bagunça-me!
Mexe comigo, por favor!
Tira-me do eixo, da trilha certa!
O equilíbrio nada cria
Desequilibra-me, por favor!
Quem sabe no meio do caminho
Entre um cambaleante passo e outro
Crio algo novo e bom


Pintura: Thomas C. Fedro

21 de janeiro de 2014

Efemeridades

Ah! Sim, eu tenho as minhas vaidades
E elas volta e meia se revelam
Olhares narcísicos em poças turvas
Rubores inflados frente a elogios
Falsas modéstias desencontradas
Suspiros satisfeitos ante ilusórios acertos
Coração aos pulos ao ouvir  te amo
Coisas grandes e pequenas dos meus dias
Efemeridades


Pintura: Andrey Bazanov

20 de janeiro de 2014

Primeiros beijos

Na memória tenho vastidão
Tantas coisas que vão e voltam
Chegam de repente e me tomam toda
Vêm em cheiros inexplicáveis
Invadem-me em gostos inconfundíveis
Abarcam-me em sensações intraduzíveis
Parecem até primeiros beijos
Aqueles inesquecíveis primeiros beijos
Todas as primeiras vezes que te beijei


Pintura: Tracey Harrington-Simpson

Fusão

Eu quero me aproximar de ti
Chegar bem pertinho, quase me fundir
Mas, fundir de um jeito diferente
De um jeito que sem medo ou confusão
Eu continuo a ser eu
E tu continuas a ser tu



19 de janeiro de 2014

Remendado

Eu tenho um coração remendado
Volta e meia está machucado
É que ele adora flores e dos espinhos esquece
Quando percebo já está todo arranhado





18 de janeiro de 2014

Polos

Entre polos e tolas antíteses
Vivo excitações tardias
Precoces melancolias
Entre um ou outro planeta retrógrado
Fico nessa e na outra margem de algum rio


Pintura: Osnat Tzadok

15 de janeiro de 2014

Mandala

Lá estava eu no verde vale
Na terra guardada por ninfas e elfos
Em dias de lua encheiando
Tantos aromas, texturas e gostos
Pele suada e arrepiada
Fui acendendo meus fogos
Percebendo as folhas secarem
Deixando, então, as águas levarem
Revolvendo minha terra 
Semeei novas intenções
Na primavera da alma
Florescerei novamente


Pintura: Viveka Singh

13 de janeiro de 2014

Vontades

Abro a gaveta das vontades 
Procuro aquelas que guardei 
As que deixei para outra hora
É tempo de desdobra-las
Deixa-las esticadas ao sol
Acaricia-las com o vento
Tirar-lhes o cheiro de mofo
E leva-las a passear


Pintura: Elizabeth Murray

10 de janeiro de 2014

Partida

Então, meus olhos nublaram
Tudo adiante turvou
Indistintas ficaram as luzes
Lumes atrás de sedas ocultas
Nas paredes, brilhos esparsos
Lá fora, poeira fina ao vento
Chão de terra flutuante
E, assim, eu não vi você partir


Pintura: Allison Cortson

9 de janeiro de 2014

Aviões de Papel

Fiz uns aviões de papel
Peguei cartas de amor
Missivas há tempos seladas
Bilhetes na gaveta guardados
Recadinhos que jamais entreguei
Dobrei tudo com zelo e sem pressa
Depois, subi além nuvens
Soltei um a um e deixei o vento levar
Fico aqui a pensar onde afinal haverão de pousar



5 de janeiro de 2014

Memórias

Boas memórias eu conservo
Guardo tudo bem guardadinho
Delas tenho potes bem cheios
Gavetas abarrotadas
Acondiciono de todo jeito
Umas ficam soltas, umas catalogadas
Algumas eu deixo no cofre
Outras eu emolduro e na parede penduro


Pintura: Katelyn Fry

1 de janeiro de 2014

Liberta

Quero estar protegida
Mas, não proteger-me demais
Hei de me oferecer aos perigos
Andar à beira do abismo, arriscar mais
É tempo de sair do casulo, por aí voar
É hora de içar a ancora, inflar velas, desapegar do cais
É momento de olhar  dentro e fora
Juntar aos velhos, o mais frescos ideais
Agora quero libertar as ideias
As imaginárias e as que se supõe reais


Pintura: Mona Davis