30 de setembro de 2014

29 de setembro de 2014

Saber

Quero saber de ti
De teus passos e compassos
Das músicas que tem ouvido
Das danças que tem bailado
Dos lugares por onde tem passado
Das coisas que te atraem o olhar
Das flores que não colhes para vê-las em seus lugares
Quero saber sobre as sementes que tem plantado
E do que a terra tem te oferecido
Quero sentir um pouco dos teus sentidos


Pintura: Dhananjay Mukherjee


Desocupada

De repente o mundo lá fora se aquieta e me desocupa
 Vozes, carros, vento, pássaro em pleno voo
Tudo de súbito pára, inesperadamente tudo cessa
Desocupada das coisas que existem, existo


Pintura:Ferdinand Hodler

25 de setembro de 2014

Contornos

Os meus contornos tem muitos pontos
Uns próximos, outros distantes
Ora são cheios, ora tracejados
Vez ou outra, são pontilhados
Mas, se ligam de todo o modo
Brincam de formar inconstantes formas
Aproximam-se e distanciam-se
Se fecham sem prévio aviso
Fazem da curva uma linha reta
Ou das retas infinitas curvas


Desenho: Peter Inglis

21 de setembro de 2014

Tempestade de Areia

Dentro de mim, ventania
Inexplicadas coisas, inexplicáveis
Tempestade de areia
Epifania


Pintura: Marian Lishman



20 de setembro de 2014

Um lugar

Tem um lugar meio escondido
Entre o que não sei e o que penso conhecer
Lá no meio de mim, onde me perco e me acho
Lugar que fica entre o dormir e o despertar
Um lugar hiato, um lugar fresta
Como se fosse uma porta aberta


Pintura: John Armstrong

19 de setembro de 2014

Bigode

Ele tinha um bigode
Tão grande que lhe escondia o sorriso
Mas, é certo que estava lá
Pois, foi homem sem deixar de ser menino
Tinha alma musical e sonhadora
Olhos que amiúde vagueavam
 Quando olhava para dentro
No horizonte se perdia






17 de setembro de 2014

Metabolismo

Tu te apercebes
Eu te metabolizo
Sinto-te fluindo, passando
Passeando por toda a entranha


Pintura: Leonid Afremov

Inesperada

Surgiste naquela tarde inesperada
Pode parecer estranho, afinal tardes são esperadas
São consequências de manhãs terminadas
Prelúdios para as noites estreladas
Tardes são praticamente premeditadas
Mas, foi naquela tarde inesperada
Que tu surgiste e me deixaste encantada
Desconfio que para sempre enfeitiçada


Pintura: Peter Granville-Edmunds

16 de setembro de 2014

Tríptico

Nem num tríptico eu caberia
Nem sei que formas me acolheriam
Talvez eu queira me desmodelar
Ficar sem bordas, me ultrapassar


Pintura: Bosch

Dunas

Ando querendo tudo solto
A vida esvoaçando por aí 
Paredes ao horizonte reverentes 
Retas se descobrindo em curvas
Pontos se entreolhando cúmplices
Portas se abrindo aos meus jardins
Quero caminhar em dunas de sonho e ar


Pintura: Marti Dixon Jones

Aragem

Teve um momento
Um breve, mas longo tempo
Uma aragem, um leve vento
Que me trouxe um atrevimento
Uma gota pura de envolvimento
Deixou aroma e gosto bento
Deixou em mim o teu movimento


Pintura: Anouk Lacasse

Tempo Livre

Por que haveria de prender o tempo?
Por que haveria de me prender ao tempo?
O tempo é um ser livre, assim como sou
O tempo não tem relógio, nem velocidade 
O tempo não corre, não passa
Eu é que corro, passo por ele
O tempo não se ganha e nem se desperdiça
Eu que o perco querendo ganhá-lo


Pintura: Xiao Mei Lin

15 de setembro de 2014

Cafezinho

Pediste Pessoa e corri a atender-te
E isso deu-me fome poética 
Fui até onde guardo os potes de meus alimentos
Mas, saciar-me sozinha não faz o menor sentido
Então, divido contigo uma fatia de Leminski
Temperada com a pimenta de Anais Nin
Sirvo, também, um bom bocado de Quintana
Porção generosa de Florbela adoçada com Coralina
Uma travessa de Adélia confeitada com Neruda
Ponho à mesa o banquete para os sentidos saciar
E como se cafezinho fosse, dou-te um gole de Hilda Hilst


Pintura: Seamus Berkeley

10 de setembro de 2014

Estampa

Faço tatuagens imaginárias
Crio formas que se transformam
Que deixam as linhas dos meus rascunhos
E a borracha  não dá conta dos vincos
Apaga, mas só um pouquinho
Então, me deixo estampar em memórias


Pintura: Lora Zombie

Escaninhos

Nos deixe mexer em teus bolsos
Nos deixe procurar em tuas gavetas, armários
Queremos saber onde guardas essa alegria inquieta
Abra os teus escaninhos e nos conte os teus segredos
Conte-nos como faz para ter esse olhar arguto
E onde te abasteces dessa energia exibida e contagiante
Explique esse jeito teu que tudo ajeita
Esse teu circular dançante por onde passas
Vamos, não encondas nada, conte-nos tudo
Queremos um bocado da tua doce agudeza
Assim poderemos seguir sem ti tão perto
Assim poderemos sentir-te aqui dentro

(Para meu amigo Selim Nigri)