29 de dezembro de 2016

Contrastes

Interessantes são certos contrastes
Das unhas negras que te riscam a clara pele
Da língua quente que te arrepia a nuca
Do teu calor que me esfria a espinha


15 de dezembro de 2016

Aromas

Fiquei à espreita
Escondida atrás das horas
Atrás dos cheiros teus
Aqueles que só tu sentes
Ali fiquei para me sentires
Degustares do jeito teu


Pintura: Ihsane Chekour

8 de novembro de 2016

Um pulo

Fiz pequena viagem
Dei um pulo ali no futuro
Fiquei nua e fresca no amanhã
Só para poder adentrar teu hoje


Pintura: Mark Kielkucki

17 de setembro de 2016

Eclipse

Às vezes, tu te eclipsa
Noutras o eclipse sou eu
Alinhamento perfeito do corpos
Brincadeiras da luz e da sombra
O que se esconde também se desnuda


Pintura: Cedar Lee







15 de agosto de 2016

Silêncio e trovão

Interessante o movimento da chama
Na redoma amparada tremula insegura
Nas paredes desenha figuras fugazes
Vestido vermelho na noite escura
Sombras e luzes a bailar pelo ar
Rodopios de um dramático tango
Que se dança em silêncio e trovão


Pintura; Mirjana Barkovic

14 de agosto de 2016

Fragilidades de estimação

Como gatinhos elas são 
Às vezes, sobem nos móveis mais altos e lá se aquietam
N'outras brincam como se nada mais houvesse
Há ainda o tempo em que em mim se enroscam
E por felinas serem, ariscas também se mostram
Mas basta lhes dar carinho
Coisa simples, nada demais
 Um colo quente, um cafuné
E logo ronronam calmas
Assim elas são
Minhas fragilidades de estimação 


Pintura: Charles Wysocki 

7 de agosto de 2016

Devorada

Não aprendi a não sentir
Tudo em mim é demasiado
Tudo é grande, fumegante, intenso
Sou prato cheio para as emoções 
Mesa posta para as sensações
Que ávidas me consomem 
Sejam deleites ou aflições
Com gosto me engolem


Pintura: Aja Kusick

19 de julho de 2016

Recreio

A tua nudez embaralhada à minha
Faz o momento onde o mundo pára
Movimento apenas do que é nosso
Da saliva que troca de boca
Das mãos que descobrem caminhos
Dos carinhos sem pressa de nada
Dos sons que desconhecem paredes
Dos cheiros que parecem ter asas
E nos levam para qualquer lugar
Sobretudo onde o tempo não conta
No instante do nosso recreio


Pintura: Stefan Kuhn

Nude

O amor tem tantas vestimentas
 Véus, sedas, linhos, brilhos
Saias, sarongues, vestidos
Às vezes, solene se poe de casaca
Também com farrapos se cobre
Dia a dia trocando de roupa
Fantasiando-se aqui e ali
Mas, admitir eu devo
Gosto quando nu ele fica
E nu me envolve inteira



12 de julho de 2016

Aperto

Amanheci com aperto sem endereço
Coisa estranha que me revolve por dentro
Coisa sem nome e nem circustância
Que procura no pulso o relógio
Como se das horas tivesse perdido o começo



6 de julho de 2016

Perspectivas

Como se fosses pintura
Quadro exposto na galeria
Grafite em muro cinzento
Fotografia ou até escultura
Assim também te vejo
Chego perto para ter detalhes
Intuir que formão te fez entalhes
Tateio para sentir texturas, relevos  
Aqueles feitos pelas demãos dos anos
Gosto de admirar-te de perto
Saber que por mais que olhe haverá mais a ver
Perspectivas


Pintura: Anita Zotkina

2 de julho de 2016

Instante

Tirei um instante para olhar dentro de mim
Tola que sou acreditei que um instante bastasse
Perdi-me em labirintos, passagens, caminhos
Desviei-me do tempo do agora
E já nem sei se ele é mesmo existente
Mas, pouco importa se tu estás em mim presente


Pintura: Dorina Costras

28 de junho de 2016

Cativa

Os teus cheiros me capturam
De súbito me sinto em teus ares
E de bom grado me faço cativa


Pintura: Lorenzina B

Teu dorso

Gosto de saber-te perto
Não saberia falar de distâncias
No máximo, talvez ali na esquina
Logo ali, entre um verso meu e o dorso teu


Pintura: Kris Hardy

6 de maio de 2016

Premência

Há um sentimento de urgência
 Premência de corpos colados
De sentir teus batimentos 
De dar-te os meus
Abraçar-te até não sei mais quando


Pintura:Juliette Gorge Coppens

Mais de nós

Escolho sempre mais de ti
Afagos
Sussurros
Abraços
Olhares 
Conversas
Silêncios
Platéia
Vapores
Calores
Chuveiros
Borbulhas
Incensos e velas
Mesa posta
Cama quente
Noites e dias
Pequenos bilhetes
Tudo o que em resumo é mais de nós


Pintura: Sladjana Lazarevic

25 de abril de 2016

Adjetivos

Pouco importam os adjetivos
Podem ser recatados ou chulos
Podem ser ditos à mesa ou na cama
Podem sem simples ou compostos
Desde que sejam ditos por ti
Desde que os antecedam aquele pronome
Aquele que me faz tua



6 de abril de 2016

Anzol

No meio do mar de gente
No cardume humano em borbulhas
Entre ondas e espumas
És tu que te destacas
És o próprio canto da sereia
E como tal, és puro encanto 
Meus olhos anzóis se lançam
No desejo de te fisgar


Pintura: Faith

6 de março de 2016

Hiato

Sensações que nascem no tato
Nas tuas mãos que me descobrem
Nas minhas que te aquecem
Nas pernas que se enroscam
Nas bocas que se tocam
Nas linguas que se molham
Nascem palavras que pedem hiato
Um silêncio breve e fundo
Nada há para se falar
Apenas ouvir com o olfato


Pintura: Nicole Roggeman

24 de fevereiro de 2016

As Paineiras da Marginal

As paineiras não ligam para o cinza 
Não dão a mínima para esquecimento da estética 
Para o amontoado de casas de paredes nuas
Para pútrido rio que perdeu seus meandros
Para fumaça dos caminhões
Para o grito das buzinas
As paineiras não ligam para as adversidades
Tampouco para seus caules de espinho
Elas florescem, simples e lindamente, florescem.



17 de fevereiro de 2016

Centelha

Atingiu-me uma magnética centelha
Veio de repente e quente
Aconteceu-me simplesmente
Foi quando distraída eu estava
Foi quase como picada de abelha
Daquelas que na hora o ardor se sente
Mas, confesso um pouco diferente
É do tipo que deixa marca boa na gente


Pintura: Casey Weldon


16 de fevereiro de 2016

Boas horas

Já não nos basta o tempo do relógio
É preciso prorrogar todas as boas horas
Adiar as apressadas despedidas
Agora temos que correr entre as vinhas
E pisar nossas uvas
E beber nosso vinho
Nos deixarmos à sombra das flores
Deitar na relva coberta de cores
Ver o azul pelas nesgas das folhas
Ali ficar entre um êxtase e outro


8 de fevereiro de 2016

Radiografia

Gosto que me vejas
Que com teu olhar me fotografes
Que me contemples frente e verso
Que repares em todas as partes
Que me fites fora e dentro
E assim me radiografes


Desenho: Lucianne Lassalle

7 de fevereiro de 2016

Quintal

Vens, mas vens agora
Deixes todo o resto para depois
Vens brincar no meu quintal
Aqui tem brisa que te lambe a pele
Tem rede que te acolhe o corpo
Flores para te colorir os olhos
Grama verde para teus pés pisarem
Texturas muitas para te instigar o tato
Música da vida para te encantar a alma
Águas para matar tuas sedes
E mesa posta para te saciar as fomes


Pintura: John Nicholson

6 de fevereiro de 2016

Casulo

Estava eu lá acanhada na vida
Enleada em fios de velhas cicatrizes
Recolhida para as coisas do amor
Estava eu lá involucrada nas defesas
Acabrunhada para os desejos
Ignorando uns tantos anseios
Estava eu lá distraída nos dias
Alheia aos olhares e encantos
E tu sem procurar me encontraste
E do casulo suavemente me libertaste


Pintura: Laurie Kaplowitz

4 de fevereiro de 2016

A vela e o incenso

A vela olhava admirada
Via através do copo à mesa deixado
Sabia que sua luz encantava
Mas, encantada ela também estava
E o incenso que ao seu lado ardia
Sabia que amor era o que via



Pés descalços

Ando me preferindo figurada
Sinto certa preguiça das literalidades
Elas parecem me deixar embotada
Amarrada para as flexibilidades
As metáforas é que tem me caído bem
Como se  fossem vestidos de chita
Daqueles para usar com os pés descalços


Pintura: Shyborg

1 de fevereiro de 2016

Relógios

Vou atrasar os relógios do mundo
Quiça parar os ponteiros
Dar-lhes um pito por terem pressa
Essa mania de acelerar de repente
Justo nas horas em que tu me visitas


Pintura: Gerald Murphy


29 de janeiro de 2016

Coreografia

Coreografei o meu silêncio
Dentro de mim ele queria dançar
Danado esse aquietar
Só no meu mundo ele não  que ficar


Pintura: Richard Young

23 de janeiro de 2016

Gostos

Gosto dos teus gostos
Das coisas que tu gostas
Dos gostos que tu tens
O gosto da tua boca
O teu gosto por rituais
O gosto dos teus dedos
O teu gosto por sinais
O gosto que tem teu sexo
O teu gosto por eu querer mais
O gosto que tem teu cheiro
O teu gosto por coisas nada usuais
O gosto que tem teus pratos
O teu gosto para que nunca sejam iguais
O gosto que tem teus sentidos
O teu gosto pelos dos meus ais


Pintura: Steeves J. Brown

19 de janeiro de 2016

Encaixe

Tu me descobriste em poesia
Encontraste a mim guardada em mim
Escondidinha em cantos meus
Mais para dentro que para fora
Exposta apenas em palavras que me saiam
Sorrateiras me escapavam
Espertas te encontraram
Com as tuas se enlaçaram
E por fim nos encaixaram


Rapapés

Esbofeteies-me com teus rapapés
Quero as lisonjas do teu olhar que fala
Teu caminhar vestido em pantufas
Louça na pia, únicos guardanapos
Os colchetes que guardam tuas pausas
Êxtases, silêncios adiados
Quero tudo nesses tempos nossos
Ontem, hoje, agora mesmo, amanhã
Sempre

Pintura: Hallie Rose Taylor




Evaporo

Tu beijas meus pés
 Eu caio de quatro
Tu sentes meus cheiros
Eu evaporo


Pintura: Natmir Lura

12 de janeiro de 2016

Aquietar

Estou com algumas palavras engasgadas
Mas, é coisa boa, nada a se preocupar
Entalaram ao te ver passar
Como que desfilando silêncios
Caminhando em teus pensamentos
Coisa de quem busca em si aquietar


Pintura: Clayton O'Brien

3 de janeiro de 2016

Pronomes

Vou misturas as pessoas
Bagunçar os pronomes
Conjugar verbos de forma imperfeita
Talvez até não me caia bem
Mas, quero um pouco ficar nua de regras


Detalhe de Pintura de Johannes Vermeer

Penúltimos Domingos


Tudo entre nós é penúltimo
Sempre tem mais para amanhã
Quiçá até para depois
Um beijo nos olhos
Um sorriso maroto
Chás, abóboras, proseccos
Conversas até três da manhã
Encaixes perfeitos
Abraços de três dias
Tempo feito para não contar
Todos os dias são penúltimos 
Domingos


Pintura: Joaquin Sorolla


2 de janeiro de 2016

Noturno

Um jardim noturno se fez
Tu que mostraste a mim
Foi numa noite de chuvas e chamas
Entre beijos, mesuras, brincadeiras gentis
Sombras brincavam ao vento
E tu dançaste em mim




Gata

Ah! Se no mundo houvesse cantos 
Num deles, quietinha, me aninharia
Ficaria lá esperando que tu passasses
Como se gata fosse dar-te-ia um bote
Dengosa em ti me enrolaria
Só para no fim tu me levares para casa

Desenho: David Spillane