31 de março de 2011

Rodopiar

O que eu queria mesmo era rodopiar
Ter-te em meus braços e descolar os pés do chão
Valsar no ar e deixar a vida fluir
Sentir na pele a brisa leve vinda de tua boca
Dar-te a leveza das palavras bobas
Aveludar teu caminho com pétalas rosas
Não pensar no sentido da vida
Deixar-me levar pela linda música que nos une
Largar para trás os infortúnios
Sem pressa e receios apenas viver

30 de março de 2011

Jardineira

Jardineira eu sou
Escolhi a semente
Tirei da dormência
Revolvi a terra
Adubei com gestos
Plantei
Com poesia reguei
Brotou
Agora borrifo palavras
Podo, dores, valorizo alegrias
Ofereço luz e também minhas sombras
Assim zelo para a fazer crescer
Crescer a muda do amor em flor


27 de março de 2011

Ecos

No pulsar forte do meu coração
vibra intensamente o meu corpo
meu sangue corre afoito
o ar insiste em entrar torto
deixa nas mãos um tremor
que se aquieta na nitidez do olhar
na voz que vem a sussurrar
e minha alma fica feliz por te escutar
ouço o eco da emoção
bate e volta sempre a falar
desse amor milenar


Passos

Nas areias de um lindo entardecer
teus pés descalços à beira mar
teu lindo olhar a refletir as ondas
e meus olhos mostram o céu a espreitar
nossos passos numa busca
lugar no cosmos devemos encontrar
para nosso eterno amor resgatar
e vida nova começar

25 de março de 2011

Deusa mortal

Sou uma deusa a ti devota
em meu Olimpo particular
fico sempre a procurar
a imensidão do teu olhar

Sou uma deusa a ti entregue
anseio na Terra estar
em mortal me transformar
e teu coração habitar 

24 de março de 2011

Dádiva

Que dádiva seria se sob esse dramático céu
Pudesse eu entranhar meus dedos nos teus cabelos
Colher os cachos e sentir nas mãos o calor de tua nuca
Aproximar meus quentes lábios e beijar-te a face levemente
Penetrar tua alma com meus olhos e assim a minha entregar
Sentir o frescor de tua pele e deixar a minha arrepiar
Inspirar seu ar e seu coração fazer vibrar

Que dádiva seria se nesta noite escura
Pudesse eu contar com seu esguio corpo a me abraçar
Deixar meus poros a transpirar a emoção de contigo estar
Desfalecer no breve instante a revelar
Colher todas as flores e ofertar
Ver teu sorriso imenso a me encorajar
Abrir mão de tudo e em ti velejar


Pintura: Georgia O'Keefe

23 de março de 2011

Como flor

Desejo como flor colher-te
em minha pele replantar-te
com minha seiva nutrir-te
com gotas de minha alma regar-te
em dias de luz forte proteger-te
em noites frias e escuras acolher-te
com as lágrimas de alegria seguir-te
e pelas vidas junto a mim carregar-te

22 de março de 2011

Penelope

Sou Penelope
Fio em palavras
o amor que me enobrece

Sou Penelope
Fio nas palavras
para declamar o que sinto

Sou Penelope
Crio veús aos que pretendem
Pois só ti podes me ter

Sou Penelope
Faço e me desfaço
na vontade de te ver

Sou Penelope
Teço todos os dias
a esperança de te ter


Pausa

Sinto como se o mundo tivesse parado
Aquietado por um breve e eterno instante
A cidade emudece solenemente
O vozerio indistinto faz-se calar
Portas não batem mais
O brinde fica suspenso no ar
Silenciam os uivos distantes dos cães
E telefones cessam de tocar
O vento sopra mudo e suave
O ator interrompe a cena
O locutor, reverente, fecha o microfone
O pintor finaliza o branco traço
E no instante preciso entre uma nota e outra
Pássaros planam silênciosos
Percebo então só meu respirar
que permite-me o imenso prazer
de teu coração descompassado escutar


19 de março de 2011

Sobre as águas

Sobre as águas dancei
Em teus braços me entreguei
Em teu peito a cabeça encostei
No ritmo próprio de teu coração vibrei

Sobre as águas flutuamos
Com a música das esperas rodopiamos
Na ausência de palavras reverenciamos
Ao brilho dos olhos nos entregamos

Sobre as águas andamos
Pegadas líquidas deixamos
Ao ver o caminho lembramos
Que desde sempre nos amamos

15 de março de 2011

Rocha

Eu sou uma rocha
assim me apresento
Eu sou uma rocha
assim me percebem

Eu sou uma rocha
com fendas e cores
texturas e dores
que a vida me deu

Eu sou uma rocha
vulcânica e quente
pulsante e atrevida
covarde e aguerrida

Eu sou uma rocha
que mesmo erodindo
no alto da encosta
mantenho-me firme
  

14 de março de 2011

Buraco

Flor do açoite
Pele em brasa
lembrança viva
na dor da noite

Lábios secos
estiam minha alma
molham meu rosto
pela memória do seu gosto

Aroma da saudade
Buraco extenso
meu peito aberto
o coração exposto

13 de março de 2011

Refugio

Olho do alto
Vago olhar
 Como águia procuro
a fome aplacar
Espero o momento
de em vôo alcançar
O que não compreendo
há de me alimentar
Escondo-me nas nuvens
refugio secreto
de quem guarda o amar 

Quebra-cabeça

És um quebra-cabeça
encaixes multiplos
imagens formadas
sorrisos velados
em olhos opacos
És um quebra-cabeça
as peças que faltam
hei de encontrar
compor a figura
conhecida aos pedaços

Acordar

Você estende a mão
convida-me a dançar
nas nuvens os passos tímidos
de quem quer apenas abraçar
Você conduz com o olhar
e eu me vejo nele flutuar
num risco de sorriso
vejo a vida aflorar
nascer de novo em sonho
assim, não quero mais acordar.




12 de março de 2011

Olhos perdidos

Tudo me remete a ti
O zapear da TV
O silêncio involuntário
O bater silencioso em meu peito
Teu sorriso incrustado na memória
O ar que parece faltar
O cigarro que queima sozinho
O copo a procura do brinde
E assim, com tudo me ligando a ti
Resgato a imagem de minha mão em teu rosto
Do infinito adornando teus dedos
Do grande e verde vale nos envolvendo
Da estrada correndo lá fora
Das conversas profundas que nasceram ingênuas
E assim, busco teu gosto na minha saliva
 E encontro meus olhos perdidos nos teus



10 de março de 2011

Quisera

Quisera que um cinzel revelasse
Quisera mostrasse as camadas
Quisera conhecesse o oculto sem dores
Quisera retirasse os excessos
Quisera não temesse o desgaste
Quisera a coragem nos unisse 
Quisera pudessemos viver sem segredos
Quisera desse conta da espera
Quisera que o amor nos bastasse
Quisera adormecesse em teus braços
Quisera fortalecesse nossos laços

3 de março de 2011

Cativo

Meu sorriso cativo abriga-se em tua retina
Vejo-o espelhado no fundo de teus olhos
Num mergulho imaginário penetro em tua alma
lá encontro a razão dele ser assim tão franco
Tua essência eu vejo e meu olhar liberto
para que possas vê-lo espelhando meu amor


Abduzida

Sou para você
Sou para mim
Sou toda e fatiada 
Retalhada e costurada
Multiplicada e dividida
Adicionada e subtraída
e quando me olhas, inteira abduzida.

1 de março de 2011

Pudim de Leite

O que é conhecer-te?
Parece que fatio um pudim de leite
Há a certeza de que está ótimo
(afinal é um pudim de leite)
mas, sempre há o suspense.
Estará ele macio?
A calda estará no ponto exato?
A que o sabor me remeterá?
A que saber se revelará?
Sim, conhecer-te é reviver o conhecido
sem uma faisca de garantia
com a certeza de ter meus sentidos se fartando
no banquete que sãos seus olhos